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"Engolimos de uma vez a mentira que nos adula e bebemos gota a gota a verdade que nos amarga." Denis Diderot

sábado, 31 de março de 2012

"Por que se chamava moço
Também se chamava estrada
Viagem de ventania.
(...)
Porque se chamava homem
Também se chamavam sonhos
E sonhos não envelhecem
"
(Clube da Esquina Nº 2 -
Milton Nascimento, Lô Borges, Márcio Borges)


Meu milésimo sonho

Parte 3

La fora uma sirene gritava. Era um camburão da polícia.
- Me ferrei! – foi o que pensei.
Desceram dois soldados e um cabo gordo.
O último trazia, preso numa gaiola, um papagaio calado.
Se aproximaram de mim...
Eu falei pra eles: - Por favor não atirem, eu me rendo!
Disse-me o cabo gordo: - Não sei do que se trata, mas tome o papagaio, cuide dele pra mim! Você será bem recompensado. Dar-lhe-ei uma promoção. Terás mais uma fita em seu braço.
Perguntei pra mim mesmo: - Desde quando um cabo, que seja gordo ou magricela, pode dar promoção a alguém?

Voltaram os três e o carro partiu veloz.
A sirene não mais tocou.
- É uma bela ave – disse eu – mas eu preciso é de alguém.
E entreguei o papagaio a interna mais calma que achei.
Ela ficou muito feliz e comentou: - Vou ensiná-lo a cantar.
Quando o bicho quebrou o silêncio gritando:
- Tem comida nessa merda?
E a boa senhora saiu de mansinho.

Eliel Silva (1986)
Imagem: Internet
"Foi um sonho medonho,
Desses que, às vezes,
A gente sonha e baba na fronha
E se urina toda e já não tem paz."
(Não Sonho Mais - Chico Buarque)

Meu milésimo sonho

Parte 2

Me encontrei com outra interna.
Falei pra ela: - Oh, posso falar com meu amor?
- Bem – disse ela – você me promete uma coisa?!
- Pode dizer – disse eu.
Ela trazia nas mãos uma espécie de sanfona. Senti que cada tecla daquela acionada provocaria uma explosão dos diabos. Mas fiquei na minha e me peguei com os santos.
Disse ela: - Dê-me um adiantamento em dinheiro!
Não entendi nada e subi as escadas correndo.
Ela gritou: - Jesus não perdoará você nunca!
Eu gritei: - Nem também aceitaria essa proposta!

No último degrau arranjei tempo pra pensar e parei.
Pus a mão no queixo: - Em que confusão eu fui me meter!
Mal acabei de pensar, ouvi som de tamancos arrastados pelo chão.
Era uma senhora bem mais velha que as outras. Ela vestia camisola. Veio a mim atraída pelo barulho.
- Oh, não sabia que estavas aqui!
- Também eu, não sabia que a senhora usava tamancos – disse eu meio sem jeito.
- Posso falar com meu amor?
- Claro, pegue a vassoura e lave o banheiro.
- Não, eu não sou o faxineiro, eu quero falar com uma garota daqui.
- Não tem importância – disse ela – faça isso para mim, sim! Os sanitários estão horríveis.
Vi que não havia jeito mesmo.
Pus-me a correr novamente.
- Ai! – gritei ao ver a diretora outra vez.
Perguntou-me ela: - Afinal, quem é você?
Eu disse: - Bom, eu não sou o John Lennon, mas tudo que eu quero é ter um pouco de paz ao lado de alguém.
- Você também não parece ser Lázaro – disse ela pra mim – mas como fede a carniça!
- Por favor, minha senhora...
- Mas que queres aqui, afinal? Pelo amor de Deus!
- Tudo que eu quero é ter ela comigo agora.
- Pois eu acho melhor é você dar o fora.
- Oh, não! Por favor. Ela é muito importante para mim.
- Que drama! – me gozou a chefona.
Depois acendeu o pavio e falou, cheia de si:
- Não e não. Saia logo daqui!

Eliel Silva (1986)
Imagem: Internet

sexta-feira, 30 de março de 2012

Sonhos... sonhos são

"Sei que é sonho
Não porque da varanda atiro pérolas
E a legião de famintos se engalfinha
Não porque voa nosso jato
Roçando catedrais
Mas porque na verdade não me queres mais
Aliás, nunca na vida foste minha."
(Sonhos Sonhos São - Chico Buarque)
Meu milésimo sonho

Parte 1

Bem, sei que toquei a campanhinha:
- Será que alguém poderia me atender?!
- Pois não, cavalheiro! – disse-me uma senhora bem idosa.
- Bom, eu preciso falar com alguém que está aí!
Ela falou: - Ah, você me trouxe o leite?
Eu disse: - Oh, me desculpe, eu sei que ainda é muito cedo, mas não sou o rapaz do leite.
- Então você é o Cabral? – perguntou-me ela.
- Bom, eu nada fiz pelo Brasil, mas procure-me num romance do Shakespeare – disse eu.
- Você parece ser um bom rapaz, mas Cinderela não pode sair.
Gritei: - Gata Borralheira é a senhora!
Ela se irritou comigo e foi chamar a superiora do colégio.
- É um malcriado – disse ela para uma freira que passava.

Mas a diretora me pareceu tão educada que cheguei a ter esperanças.
Lembrei-me de uma canção que eu gosto e gritei: “Oh, Sister!”
Ela me fez sentar e perguntou:
- Em que trabalhas? Me pareces vagabundo!
Não entendi a charada. Por que não me perguntou logo o que eu queria?
- Bom, na realidade quase nada faço, falei pra ela sem ficar nervoso, mas, arranje-me um violão. Talvez eu lhe tire alguns acordes.
Disse-me aquela senhora: - Já vi tudo. És bandido! Cai fora, senão chamo a polícia!
Eu disse pra ela: - Pensei que só a outra fosse esclerosada.
Ao dizer isso ela me jogou um vaso nos pés.
Apanhei as flores do chão e saí correndo.

Eliel Silva (1986)
Imagem: Internet 

sexta-feira, 23 de março de 2012

Reencontro

 Folia de Rei (Chico Anysio e Arnaud Rodrigues)
 Baiano e Os Novos Caetanos

Ai, andar andei!
Ai, como eu andei!
E aprendi a nova lei:
Alegria em nome da rainha
E folia em nome de rei!
Alegria em nome da rainha
E folia em nome de rei!

Ai, mar marujei!
Ai, eu naveguei!
E aprendi a nova lei:
Se é de terra que fique na areia
O mar bravo só respeita rei!
Se é de terra que fique na areia
O mar bravo só respeita rei!
Ai, voar voei!
Ai, como eu voei!
E aprendi a nova lei:
Alegria em nome das estrelas
E folia em nome de rei!
Alegria em nome das estrelas
E folia em nome de rei!

Ai, eu partirei!
Ai, eu voltarei!
Vou confirmar a nova lei:
Alegria em nome de Cristo
Porque Cristo foi o Rei dos reis!
Alegria em nome de Cristo
Porque Cristo foi o Rei dos reis!
Alegria em nome de Cristo
Porque Cristo foi o Rei dos reis!
Alegria em nome de Cristo
Porque Cristo foi o Rei dos reis!

* Nossa homenagem ao velho Chico, que reencontra finalmente seu velho parceiro.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Hoje... e sempre




Água que nasce na fonte
Serena do mundo
E que abre um
Profundo grotão
Água que faz inocente
Riacho e deságua
Na corrente do ribeirão...
Águas escuras dos rios
Que levam
A fertilidade ao sertão
Águas que banham aldeias
E matam a sede da população...
Águas que caem das pedras
No véu das cascatas
Ronco de trovão
E depois dormem tranqüilas
No leito dos lagos
No leito dos lagos...

Água dos igarapés
Onde Iara, a mãe d'água
É misteriosa canção
Água que o sol evapora
Pro céu vai embora
Virar nuvens de algodão...
Gotas de água da chuva
Alegre arco-íris
Sobre a plantação
Gotas de água da chuva
Tão tristes, são lágrimas
Na inundação...
Águas que movem moinhos
São as mesmas águas
Que encharcam o chão
E sempre voltam humildes
Pro fundo da terra
Pro fundo da terra...

Terra! Planeta Água
Terra! Planeta Água
Terra! Planeta Água...

(Planeta Água - Guilherme Arantes)

quarta-feira, 14 de março de 2012

Só uma palavra me devora

Cícero, Willian e Ilton 
(em evento do Goto Seco)

O mar e a lua

O mar, a lua, eu e você
Eu, você, o mar e a lua
O mar, você, a lua e eu
A lua, o mar, eu e você
Todos juntos numa coisa só
Na mais perfeita representação da natureza

O que seria do amor sem o mar?
O que seria do mar sem o amor?
O que seria do meu amor sem as ondas do mar?
Que com seus vai-e-vem embriagantes
Levam meus poemas apaixonantes
Para a bela e solitária sereia
Que se esconde nos meandros
Dos parrachos de Maracajaú

O mar me alimenta
Não de peixes, mas de vida
Com sua imensidão, dilui minhas tristezas
E me fortalece com as energias do bem
Do além, além-mar

Tristes os que não contemplam o mar
Na simplicidade de suas marolas
Ou na imensidão dos tsunamis
Ma agora eu decreto: que todos amem
Amem o mar
O mar e a lua
Que despida, aparece nua
Para contemplar o mar

O mar, a lua, eu e você
Eu você, o mar e a lua
O mar, você, a lua e eu
A lua, o mar, eu e você
Tudo misturado numa coisa só
O mar é uma onda.

                                   Ilton Soares
***
Traduzir-se

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.
Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.
Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.
Traduzir uma parte
na outra parte
– que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?

Ferreira Gullar

 Imagens: Internet

segunda-feira, 12 de março de 2012

Águas que ainda rolam

"Águas de Março" fecha o verão de 2012 completando 40 anos; nova geração da MPB faz releitura da canção

Dolores Orosco
Do UOL, em São Paulo
Em maio de 1972, o jornal "O Pasquim" chegava às bancas com um encarte especial, que trazia um compacto com duas canções. Mais do que agradar aos leitores, o disquinho marcaria para sempre a música brasileira. Era no lado A que estava “Águas de Março”, pela primeira vez apresentada ao público.
Mas foi dois meses antes desse discreto lançamento, há exatos 40 anos, que começou a história da composição de Tom Jobim (1927-1994). Uma música que se tornaria clássico tardio da Bossa Nova e até hoje famosa mundialmente.
Por recomendação médica, em março de 1972 Jobim passava o fim do verão buscando o ar puro do campo, no sítio da família em São José do Vale do Rio Preto, região serrana do Rio. O cenário bucólico inspirou os esboços de “Matita Perê” – álbum lançado um ano depois, com “Águas de Março” encabeçando a lista de oito músicas.
“Naquele tempo meu pai tinha decidido parar de beber e fumar, depois de levar uma dura do médico”, recorda o músico Paulo Jobim, filho de Tom. “Acho que até na letra da música ele revelou um pouco da angústia e do medo da morte”.
Fonte: uol ENTRETENIMENTO Música
Matéria completa no link: http://musica.uol.com.br/ultnot/2012/03/09/aguas-de-marco-fecha-o-verao-2012-completando-40-anos-nova-geracao-da-mpb-faz-releitura-da-cancao.jhtm

sábado, 10 de março de 2012

Dá-lhe, Morrissey!

Morrissey critica príncipe e põe banda para tocar de sunga no Rio

Ex-líder do The Smiths deixou boa parte dos hits mais batidos fora do setlist, mas empolgou público na Lapa em 1h30 de show

A porta da Fundição Progesso, na Lapa, talvez a zona que mais concentra eventos alternativos no Rio de Janeiro, remetia aos tempos áureos da boate Bunker, em Copacabana, quando o público roqueiro que dançava ao som das carrapetas de Edinho e Wilson Power se misturava ao das casas GLS que ficavam ao lado. Figuras das mais estranhas às mais normais, de cabelos grisalhos ou nem tanto, viram o ex-líder do "The Smiths", Steven Patrick Morrissey, ou apenas Morrissey, subir ao palco na noite desta sexta-feira (09) ao lado de uma turma de marmanjos usando somente sungas amarelas e um personagem de guitarra em punho, vestido azul brilhante e peruca ruiva. Em 1h30 de apresentação, ele destilou alguns dos clássicos mais importantes de sua carreira solo e também da antiga banda, mas deixou diversos deles fora do setlist, o que fez com que boa parte da plateia demorasse a entender que o show havia acabado. "Bigmouth Strikes Again", "This Charming Man", "Suedehead" e outros hits manjados foram colocados de lado pelo inglês, que não hesitou em criticar o membro da família real britânica que desembarcou no Rio de Janeiro. "Vocês sabem que o príncipe Harry está aqui", começou a discursar o cantor, já ouvindo uma sonora vaia, que se transformaria em aplausos rapidamente. "Ele veio pegar o dinheiro de vocês. Por favor não dêem a ele", em referência a um dos objetivos da visita que é captar investidores para a Olimpíada de Londres, em julho e agosto deste ano.

Fonte: iG - último segundo

Matéria completa no link: http://ultimosegundo.ig.com.br/cultura/musica/morrissey-critica-principe-e-poe-banda-para-tocar-de-sunga-no-ri/n1597678253135.html

É sempre bom lembrar...

"Os cães ladram e a caravana passa..."
***

Outra...


“Toda geração de músicos vive o mesmo ciclo: começa xingando os pais, depois xinga os professores, depois o sistema e por fim a si mesma. Quando não tem mais quem xingar, acaba falando de amor.” Erasmo Carlos