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"Engolimos de uma vez a mentira que nos adula e bebemos gota a gota a verdade que nos amarga." Denis Diderot

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Saudade


Meu pai, eu não preciso de um dia específico para me lembrar de você. Por todo canto que tenho andado, eu te vejo, sinto o que ficou de você em mim. Os seus ensinamentos, o seu exemplo de pessoa simples e digna, a sua maneira leve de tocar a vida em frente, sem tantos anseios. E não foi usando terno e gravata, não foi escrevendo na lousa da nossa escola imaginária, coisa que aliás você nem conheceu, não foi usando desses artifícios que você me ensinou a praticar o bem, mas com as suas roupas surradas da lida diária, seu cheiro forte de suor impregnado na casa, quando você chegava do trabalho incansável. Cada palavra simples e carregada de tanta verdade nua, ecoava nas nossas paredes, e se armazenavam no nosso ser. Quero te dizer também que, pelo menos hoje, eu não vou visitar o seu túmulo, farei num momento mais ameno. Sei que não estás tanto ali, pois o que depositei naquela campa, numa manhã triste de janeiro, não foi necessariamente você, mas, parte sua. Foi o que restou de tantos anos de sofrimento em cima de uma cama. E não vou ser hipócrita a ponto de dizer que eu preferia que você estivesse ainda aqui conosco. Não, eu não queria. Não do jeito que você viveu naqueles últimos dias, onde somente os mais próximos, e por questão de necessidade, suportavam te ver naquele estado. Sei que estás com Deus. Impossível pensar de outra forma, visto que foste um homem tão bom, e mesmo assim, por conta desses tantos mistérios indecifráveis da vida, ainda tiveste que “pagar” tão caro por longos oito anos. Se é mesmo como dizem, meu pai, a gente vai se encontrar um dia. Se não, o que vivemos juntos já foi suficiente para tornar-se eterno. Sua bênção, meu pai!...(Ao meu saudoso pai Daniel Ferreira da Silva, um homem justo, um grande homem.)