Definitivamente os meus tempos de "Cinderelo" acabaram. Eu não sonho mais. Também não me permito ter pesadelos. Tudo está muito claro: a escuridão se aproxima. Sim, à essa altura da vida o "decolores" desbotou. Mas a minha alma leve, assim, moldada ao longo dessa minha existência, hoje me faz flutuar sobre o peso dessas coisas. Não quero rezas, não quero elogios baratos, quero somente seguir... Viver já me é o bastante. E quando a noite definitiva chegar, aquela sem estrelas, sem luar de prata, e me pegar de jeito, nada mais eu poderei fazer. Desconheço o passadio daqueles que já atravessaram a ponte.

  

 

Tenho alguns bichinhos de estimação e é comum eu comprar ração para eles toda semana. Não tenho uma loja certa para visitar, sempre entro naquela que eu passar perto. Dias atrás, por acaso, passei numa dessas casas de ração, bem pequena, humilde até, eu diria, e resolvi entrar. Uma mocinha me atendeu. Por sinal, muito bem. Diante do seu tratamento, fiquei curioso de nunca tê-la visto antes, e perguntei se ela era daqui da cidade. Me disse que era do interior. Feita a compra da ração, fui embora. Voltei na outra semana, e dessa vez acompanhado da minha neta. O mesmo atendimento. Sorridente a mocinha me deu bom dia e perguntou: tudo bem com o senhor?! Respondi que sim. Ela fez elogios a minha neta, brincou com ela, e mais uns quilos de ração eu levei para casa. Sei que tudo isso parece tão normal, mas há algo novo: o fato de bem atender. Ser simpático, ser mais gente, muito embora em tempos tão confusos. E fico feliz de poder encontrar, mesmo numa loja para bicho, alguém com tanta delicadeza com o ser humano.