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"Engolimos de uma vez a mentira que nos adula e bebemos gota a gota a verdade que nos amarga." Denis Diderot

terça-feira, 9 de maio de 2023

 

 Olá, sargento! Anote aí...

Hoje seria mais um aniversário pra você. 70 anos. Mas na verdade não o deixa de ser. Ano passado você foi lembrado por suas vizinhas. Foi um gesto muito bonito. Ainda mais porque, sem que elas imaginassem, tratava-se da última celebração, pois dois meses e meio depois você partiu. Aparentemente foi tudo muito rápido. Do diagnóstico da sua doença ao desfecho final. Mas não. Eu que te acompanhei bem de perto por todos esses anos, percebi, desde que nossos pais se foram, que você passou por uma mudança de comportamento. A doença física lhe apareceu como uma forma de justificar a sua morte, mas o seu espírito há muito já estava tocado. Vez em quando, em conversa, você deixava escapar o vazio que lhe abatia. Os velhos sempre foram o esteio daquela casa e da sua vida. Sem eles lhe faltou o chão. E assim o “novo tempo” foi te roendo feito uma traça. Até que a hora chegou.
Sabe, não é que eu seja insensível, mas, realista, eu diria. De maneira que eu não fui questionar, blasfemar ou ficar de mal com Deus por tudo que aconteceu. Com os meus pais e com você. Aprendi nessa vida que tudo tem que seguir o seu curso. E agora o que ficou pra trás assim vai estar. Nada mais interessa a você e aos velhinhos, a não ser as nossas lembranças e o nosso carinho. Estou tentando conservar a casinha. Do meu modo e dentro das minhas possibilidades, mas estou. Conheço melhor que ninguém cada palmo daquele chão. E confesso, nas vezes entro ali, a paz que encontro nem sei descrever, é algo diferente. Certamente devido às boas lembranças e a energia que por lá ainda existe.
Mas pra você agora tudo é sossego. E não precisa estar em posição de sentido. Sargento... descansar! Isso não é um comando, é um convite. Fica em paz! 🙏
Eliel Silva, 06.05.2023

 

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