“Eles vão atirar-te uma pedra
quando fores pela rua
fora.
Eles vão atirar-te uma pedra
quando tentares conservar o teu lugar.
Eles vão atirar-te uma pedra
quando andares de rastros.
Eles vão atirar-te uma pedra
quando fores a caminho da porta.
Mas eu cá não me sentiria abandonado,
toda a gente devia apanhar uma pedrada.”
Bob Dylan
Hard times
Pois
é, meu caro amigo, minha cara amiga. Foram tempos difíceis aqueles que eu
passei. Havia festa por todos os lugares. O som do povo era estridente ao
extremo. Mas o meu era só o som do silêncio. Silêncio que por vezes me
apavorava. Me consumia. Eu me via feito uma gaivota forçada a isolar-se do seu
bando, e por razões que eu não concordava. Alguns até me ouviam, mas envolvidos
em seus afazeres, não havia espaço para uma atenção maior. Quase cheguei a me
convencer de que eu estava completamente errado. Que havia estragado toda uma
vida. Saía pelas ruas à procura de um ombro amigo. Aumentei, por questão de
necessidade - sou sincero em dizer – as minhas horas de igreja. E foi engraçado
quando certa vez, antes da missa começar, eu sentado num lugar à parte, temendo
as más línguas, com medo de alguém me expulsar dali, eis que de repente o
celebrante caminha em minha direção. Qual não foi o susto que levei. Tremi.
Gelei. Quase me borrei. Mas já estando ali num lugar tão sagrado, me peguei com
os santos. Pedi força e proteção, mas aguardei a sentença. Pensei comigo: vai
ser expulsão, “excomunhão”, ou, na melhor (ou pior) das hipóteses, uma
penitência daquelas. Mas para minha surpresa o sacerdote sorriu, com aquelas
suas vestes tão bem cuidadas – e tradicionais -, elegante como um rei (como
Salomão, talvez. Mas não como os lírios do campo), me chamou de “meu filho” e
me perguntou se estava tudo bem. Ora, saído do inferno das minhas suspeitas
naquele instante, já me vendo livre de qualquer condenação e isento de qualquer
penitência, vi naquele homem a personificação do próprio Jesus Cristo. Lembrei-me
daquelas “pedras” que Ele mandou que atirassem e ninguém se atreveu. Dei um
sorriso de orelha a orelha e lhe respondi que estava sim, tudo bem. Ele seguiu
em frente, cumprimentando outros fiéis, acalentando outras almas. Enquanto isso
eu pensava comigo: que maravilha viver! E foi assim que sobrevivi àqueles
tempos difíceis. De uma coisa estou bem certo: Deus escreve certo por linhas
certas. Ou tortas. Mas escreve.
Eliel
Silva/julho.2013
Foto: Eliel Silva
Foto: Eliel Silva
"Ando
devagar porque já tive pressa
E levo esse sorriso porque já chorei demais..."
E levo esse sorriso porque já chorei demais..."
Almir Sater / Renato Teixeira
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