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"Engolimos de uma vez a mentira que nos adula e bebemos gota a gota a verdade que nos amarga." Denis Diderot

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Além das aparências

“É assim que Deus te vê
 Além das aparências
 Conhece os teus problemas, 
vê a tua dor
 Deus vem me socorrer.”
(“Além das Aparências” –
Beno César / Solange de César)


O LADO HUMANO DO SAUDOSO WILSON SIMONAL


As reportagens sobre artistas quase sempre focalizam dois aspectos: a sua vida amorosa e privada, e a sua riqueza, real ou pressuposta.
No primeiro caso, as publicações escandalosas se fartam no devassar de intimidades, dando dimensões extraordinárias a fatos que seriam corriqueiros na vida do homem comum.
As publicações regulares, em suas colunas especializadas, se fazem mensageiras da cegonha que vai chegar, cupidos de amores nem sempre verdadeiros, arautos da elegância e do bem-vestir, e também profetas agourentos de desquites e separações.
No segundo caso, a prosperidade do artista, quando levada a público através de qualquer meio de comunicação, traz sempre objetivo oculto. Raramente essa prosperidade, muitas vezes vista através de poderosas lupas, é exposta e alardeada com a alegria dos que se sentem bem sabendo alguém vitorioso. Pelo contrário, nas entrelinhas há um travo de despeito, de inveja, de amargor.
Partindo desse princípio, o artista que se tornou um vitorioso, se compra um automóvel ou um apartamento, se procura garantir o futuro, a velhice, e arruma o chamado pé-de-meia, ao público logo se informa a marca do automóvel, o preço, a área do apartamento em todos os seus detalhes e respectivo custo.
Dir-se-á que o artista famoso pertence mais ao público que a si mesmo, e que, por isso, ao público devem ser dadas certas informações. Em termos. Porque a insistência em torno dos muitos milhares ganhos, dos cachês fabulosos, dos contratos astronômicos - na maioria irreais e fermentados, também, pela máquina publicitária - deixa a impressão de que os seus veiculadores são, na realidade, refinados dedos-duros da fiscalização tributária.

O OUTRO LADO
Se o açodamento publicitário em torno da vida privada do artista e de sua prosperidade não tem limites, em contraposição o silêncio sobre os seus atos de bondade e de desprendimento, também é uma constante. Certo que determinados artistas seguem o preceito de fazer o bem sem saber a quem, escondem quanto podem as suas benemerências, não desejam sobre elas qualquer tipo de publicidade. Mas, se esses gestos de beneficência, se essas atitudes raramente encontradas até em indivíduos que já nasceram sob as bênçãos da fortuna, são conhecidas do público, lamentavelmente ninguém bate palmas, ninguém grita ôba!

WILSON SIMONAL
Simonal foi um menino pobre. Deu duro, foi tudo na vida, até cobrador fantasiado de vermelho pelas ruas. Wilson Simonal tornou-se artista famoso e o seu nome lotava estádios. Simonal era um artista caro. Quem o contratava sabia que ia ganhar dinheiro, muito dinheiro. Ele pagava bem ao seu conjunto musical, os Simonautas, constituído de excelentes músicos. Mas, quando se publicava que o cachê de Simonal era de 30.000 cruzeiros, havia  espanto!
O que não se dizia, o que não causava espanto, era que Simonal, sendo um artista caro, era também uma excelente figura humana, apresentando-se sem ganhar um centavo, quando se tratava de cantar para os que precisavam.

No início da década de 70 a Produção do Programa Flávio Cavalcanti (Tv Tupi/RJ) procurou Simonal para fazer um número - um só número.  Ele impôs condições:
- Só se fosse um show de quarenta e cinco minutos, sem interrupção, produzido por sua própria agência, a Simonal Produções. Perguntado quanto iria custar, ele disse: um precinho camarada: 30 mil cruzeiros.
A equipe de produção estremeceu. Não havia essa verba. Estava estourada. Mas aí entrou a Shell. Deu o dinheiro a Flávio Cavalcanti para pagar ao Simonal. Simonal recebeu o dinheiro e devolveu a Flávio Cavalcanti: para a Casa dos Meninos de Petrópolis. Oitenta crianças desvalidas foram beneficiadas por Wilson Simonal.
Os artistas que ganham muito, que ganham bem, que ganham o que realmente merecem, também têm dessas coisas. Mas o silêncio é profundo. Mas Deus acaba sabendo de tudo.

Texto adaptado da Revista O CRUZEIRO, versão digitalizada, publicada originalmente em 15 de Setembro de 1970. 
Adaptaçao do texto: Edvaldo Morais
Imagem: Internet

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