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"Engolimos de uma vez a mentira que nos adula e bebemos gota a gota a verdade que nos amarga." Denis Diderot

sábado, 24 de julho de 2010

Por dentro do Rock


Rock:
Uma música que nasceu sob o signo da rebeldia
Parte 1(anos 50)


Apagam-se as luzes do cinema. A sessão começa. Na telona vai sendo apresentada ao público a primeira mensagem do filme “... Hoje nos preocupa a delinqüência juvenil, suas causas e seus efeitos. Nos preocupa especialmente quando esta delinqüência chega as escolas. As cenas e incidentes aqui mostrados são fictícios. Entretanto acreditamos que a conscientização pública é o primeiro passo para remediar qualquer problema. Foi com esse espírito e essa fé que realizamos Sementes da Violência. Desenrola-se o drama. Uma história marcante, polêmica, forte. A maioria das cenas se desenvolve na North Manual High School, em Nova York. Richard Daddier, ex-veterano de guerra consegue uma vaga para lecionar a disciplina de Inglês nessa escola. Fica muito feliz. Nem sabe ele que vai travar uma verdadeira batalha com uma galera da pesada: a maioria dos alunos são verdadeiros delinqüentes juvenis que não estão nem aí para as instituições de forma geral, nem muito menos com educação. Enfim o professor, depois de muita luta consegue dominar as feras. Vencem o bom senso, a perseverança e a paciência. O filme? Sementes da Violência(BlackBoard Jungle). O ano? 1955, apesar de parecer um roteiro dos dias atuais. Os atores? Glen Ford e grande elenco. Nessa mesma linha seguem os clássicos O selvagem, (1953), com Marlon Brando e Juventude Transviada(1955), com James Dean. O tema do filme é a educação e o enredo pode ser considerado uma metáfora mostrando o embate entre a rebeldia juvenil e as Instituições: igreja, família e escola.
Mas e daí? O que todos esses filmes tem a ver com rock? Tudo!!! Não de uma forma direta, é verdade, mas por uma questão de contexto social. Esse gênero musical teve seu berço e seu desenvolvimento no início da década de 50. O mundo se recuperava do choque e dos danos provocados pela Segunda Guerra Mundial e da destruidora bomba atômica. Entretanto o pós-guerra trouxe para a América uma era de prosperidade econômica. Era um tal de comprar esse ou aquele produto eletrônico... Uma verdadeira febre! Infelizmente nem todos podiam ter acesso a todas essas benesses. Os afro-americanos do sul, por exemplo, estavam afastados desta era de prosperidade e de liberdade. Além disso, essa classe sofria de forte segregação racial. Some-se a isso o início da Guerra Fria e o do Movimento dos Direitos Civis. Foi em meio a esses fatores que cresceu a juventude do início da década de 50. Jovens, que provavelmente, faziam toda uma leitura dessa realidade, e o inconformismo lhes vinha à mente. Musicalmente já não se interessavam pelas músicas que os pais deles ouviam. Sentiam necessidade de algo novo. E esse tal do rock’n roll estava chegando e com força total para preencher o vazio sentido por aqueles jovens. Um desses sinais claros de que uma forte onda estava em andamento foi o sucesso feito pela música Rock Around the Clock, de Bill Halley and His Comets, depois de entrar na trilha sonora do filme Sementes da Violência.
De onde veio esse rebelde, eletrizante, envolvente, chamado rock’ roll? Uma olhada ao passado diz que ele é filho do Rhythm and Blues ou R&B(estilo musical que se desenvolveu a partir do blues), do Country, e da música Gospel negra. Estilos que vinham evoluindo na música americana desde o período da colonização. O blues traduzia os sentimentos da alma negra. A letras falavam de angústia e tristeza, solidão, desilusões amorosas. Em sua fase inicial era acompanhado por violão, banjos, gaita de boca. O country-western era a música dos brancos pobres do sul. Nos cultos evangélicos desenvolvia-se a música gospel negra. Assemelhava-se ao blues nas escalas e no caráter de improviso. Diferia deste no sentido de que suas músicas falavam de salvação e esperança. Caracterizava-se como música elétrica e dançante. Daí é perfeitamente compreensível o comentário de Elvis Presley, no início de sua carreira, ante as críticas de certos setores sociais em relação a sua música e a sua dança: “Qual o problema? Eu também danço assim na igreja.”
Aos pioneiros, estejam eles em qualquer área, se deve sempre tirar o chapéu. Pois a eles cabem carregar as pedras mais pesadas, abrir as trilhas mais difíceis, subir as ladeiras mais íngremes. Quando um jovem dos dias de hoje mergulha no universo do rock, seja esmerando-se em dedilhados ou improvisos na guitarra, seja cantando a plenos pulmões, ou pelo simples modo de dançar, talvez nem imagine quantas pressões tiveram que enfrentar os pioneiros deste estilo. E esse crédito se deve a gente como Elvis Presley. Elvis, um caipira branco, pobre, nascido no Mississipi foi arremessado bruscamente da pobreza ao estrelato. Imagine a confusão que isso é passível de causar na cabeça de um recém saído da adolescência. Cresceu ouvindo country, até por ser esta a música característica de seu grupo social. Além disso, era apaixonado pela música negra, incluindo o gospel sulino, do qual era fã ardoroso. Foi descoberto por Sam Philips, dono de uma pequena gravadora em Memphis. Em pouco tempo fez sucesso estrondoso com uma música quente e um ritmo sensual. Fez a alegria de muitos jovens e foi acusado por setores da sociedade de ser um agitador, incentivador da violência e rebeldia. E tudo isso, imaginem, só por causa da música que fazia!
Elvis Presley, Buddy Holly, Jerry Lee Lewis, Bill Halley, Litlle Richard, Carl Perkins, Chuck Berry, Fats Domino, Bo Didley, The Everly Brothers, foram alguns dos pioneiros que desfilaram pelos céus do novo ritmo e tiveram nele papel fundamental.
O rock dos primeiros anos, apesar de não possuir caráter de contestação política, levanta-se contra os hábitos e costumes sociais vigentes à época. Em outras palavras: era igual a cavalo selvagem solto no pasto. Era preciso laçar e colocar freio no bicho enquanto ainda era tempo... e a pressão veio forte em cima desses músicos. Tanto que quem não teve a carreira marcada pela tragicidade, acabou sendo domesticado, como é o caso do próprio Elvis, que ao voltar do exército já não possuía em sua música aquela agressividade e rebeldia iniciais, optando mais por baladas românticas. Em resumo, pode-se dizer que em fins da década de cinqüenta o rock era como brasa ardente repousando sobre cinzas. E assim, viramos essa primeira página deste gênero musical tão controverso.

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