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"Engolimos de uma vez a mentira que nos adula e bebemos gota a gota a verdade que nos amarga." Denis Diderot

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Ao poeta

Manoel Wenceslau Leite de Barros (Cuiabá MT, 1916). Publicou seu primeiro livro de poesia, Poemas Concebidos Sem Pecado, em 1937. Formou-se bacharel em Direito no Rio de Janeiro RJ, em 1941. Nas décadas seguintes publicou Face Imóvel (1942), Poesias (1946), Compêndio para Uso dos Pássaros (1961), Gramática Expositiva do Chão (1969), Matéria de Poesia (1974), O Guardador de Águas (1989), Retrato do Artista Quando Coisa (1998), O Fazedor de Amanhecer (2001), entre outros. A partir de 1960 passou trabalhar como fazendeiro e criador de gado em Campo Grande MS. Ao longo das décadas de 1980 e 1990 veio sua consagração como poeta. Em 1990 recebeu o Grande Prêmio da Crítica/Literatura, concedido pela Associação Paulista de Críticos de Arte e o Prêmio Jabuti de Poesia, pelo livro O Guardador de Águas, concedido pela Câmara Brasileira do Livro. Manoel de Barros é um dos principais poetas contemporâneos do Brasil. Em sua obra, segundo a crítica Berta Waldman, "a eleição da pobreza, dos objetos que não têm valor de troca, dos homens desligados da produção (loucos, andarilhos, vagabundos, idiotas de estrada), formam um conjunto residual que é a sobra da sociedade capitalista; o que ela põe de lado, o poeta incorpora, trocando os sinais".

Seis ou Treze Coisas que Aprendi Sozinho
de "O Guardador de Águas", Ed. Civilização Brasileira.



1
Gravata de urubu não tem cor.
Fincando na sombra um prego ermo, ele nasce.
Luar em cima de casa exorta cachorro.
Em perna de mosca salobra as águas se cristalizam.
Besouros não ocupam asas para andar sobre fezes.
Poeta é um ente que lambe as palavras e depois se alucina.
No osso da fala dos loucos têm lírios.

3
Tem 4 teorias de árvore que eu conheço.
Primeira: que arbusto de monturo agüenta mais formiga.
Segunda: que uma planta de borra produz frutos ardentes.
Terceira: nas plantas que vingam por rachaduras lavra um poder mais lúbrico de antros.
Quarta: que há nas árvores avulsas uma assimilação maior de horizontes.

7
Uma chuva é íntima
Se o homem a vê de uma parede umedecida de moscas;
Se aparecem besouros nas folhagens;
Se as lagartixas se fixam nos espelhos;
Se as cigarras se perdem de amor pelas árvores;
E o escuro se umedeça em nosso corpo.

9
Em passar sua vagínula sobre as pobres coisas do chão, a
lesma deixa risquinhos líquidos...
A lesma influi muito em meu desejo de gosmar sobre as
palavras
Neste coito com letras!
Na áspera secura de uma pedra a lesma esfrega-se
Na avidez de deserto que é a vida de uma pedra a lesma
escorre. . .
Ela fode a pedra.
Ela precisa desse deserto para viver.

11
Que a palavra parede não seja símbolo
de obstáculos à liberdade
nem de desejos reprimidos
nem de proibições na infância,
etc. (essas coisas que acham os
reveladores de arcanos mentais)
Não.
Parede que me seduz é de tijolo, adobe
preposto ao abdomen de uma casa.
Eu tenho um gosto rasteiro de
ir por reentrâncias
baixar em rachaduras de paredes
por frinchas, por gretas - com lascívia de hera.
Sobre o tijolo ser um lábio cego.
Tal um verme que iluminasse.

12
Seu França não presta pra nada -
Só pra tocar violão.
De beber água no chapéu as formigas já sabem quem ele é.
Não presta pra nada.
Mesmo que dizer:
- Povo que gosta de resto de sopa é mosca.
Disse que precisa de não ser ninguém toda vida.
De ser o nada desenvolvido.
E disse que o artista tem origem nesse ato suicida.

13
Lugar em que há decadência.
Em que as casas começam a morrer e são habitadas por
morcegos.
Em que os capins lhes entram, aos homens, casas portas
a dentro.
Em que os capins lhes subam pernas acima, seres a
dentro.
Luares encontrarão só pedras mendigos cachorros.
Terrenos sitiados pelo abandono, apropriados à indigência.
Onde os homens terão a força da indigência.
E as ruínas darão frutos.

Fonte: Jornal de Poesia
Link: http://www.jornaldepoesia.jor.br/manu.html#seis

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Boas novas


"Estava à toa na vida
O meu amor me chamou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor
A minha gente sofrida
Despediu-se da dor
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor."
(A Banda - Chico Buarque de Hollanda)
 
Banda de Música Municipal Tenente Djalma Ribeiro
Foto: Eliel Silva (Arquivo do blog)



BANDA DE MÚSICA TENENTE DJALMA RIBEIRO RECEBE NOVOS INSTRUMENTOS

A Banda de Música "Tenente Djalma Ribeiro", de Ceará-Mirim, que é um dos mais antigos projetos de valorização da cultura do município, recebeu novos instrumentos.
A solenidade de entrega aconteceu na tarde desta quinta-feira 13/12 no auditório "Dr. Orione Barreto" do Centro Administrativo do município, e contou com a presença do diretor-presidente da Fundação de Cultura Nilo Pereira, Waldeck Araújo, da secretária de Defesa Social do Município Aretuza Kaline, além de Artemísia Soares, técnica responsável pela elaboração do projeto.
A aquisição dos novos instrumentos faz parte de um convênio firmado pela Prefeitura de Ceará-Mirim através da Fundação de Cultura Nilo Pereira com a Fundação Nacional de Cultura do Ministério da Cultura que liberou uma verba de R$ 25.800,00 para a compra de 12 novos instrumentos, entre eles, teclado, bateria, tuba, entre outros.
"Estamos concretizando um sonho dos componentes desta tradicional e importante Banda de Música, ao mesmo tempo, do próprio povo cearamirinense que tem na Banda uma espécie de patrimônio cultural do município", ressalta o prefeito Antônio Peixoto.
Atualmente, com a participação de 22 músicos, a Banda tem três objetivos principais: a função social, oferecendo atividade supervisionada aos participantes, oferecer educação musical de qualidade, influenciando os participantes a serem mais sensíveis para o mundo e representar o município de Ceará-Mirim, estando presente em diversos eventos.
"A Banda Municipal é um investimento intelectual, importante para melhorar a vida dos cidadãos", declarou na oportunidade, o diretor-presidente da Fundação de Cultura Nilo Pereira, Waldeck Araújo.
Para Artemísia Soares, técnica responsável pela elaboração do projeto, a reestruturação da Banda de Música, melhora a qualidade de vida no que diz respeito ao bem estar e principalmente a cultura do município de Ceará-Mirim.
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Fonte:
Jorge Moreira
Assessor de Comunicação Social
Prefeitura de Ceará-Mirim

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Nossa homenagem

Luiz Gonzaga do Nascimento
(Exu, 13 de dezembro de 1912 / Recife, 2 de agosto de 1989)

Nosso adeus

Pandit Ravi Shankar

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Dos tempos do Chaminé


“Em paz eu digo que eu sou o antigo do que vai adiante.
Sem mais, eu fico onde estou, prefiro continuar distante...”
(Resposta – Nando Reis / Samuel Rosa)





Jorge Soares de Oliveira

“Só se vê bem com o coração.
O essencial é invisível para os olhos.”
Exupéry
Nos Estados Unidos, lá pelos anos 20 e 30, eles eram a voz do seu país. Lemon Jefferson, Willie Mctell, Willie Johnson e outros mais. Algumas décadas depois, Ray Charles, Jeff Healey e Stevie Wonder. Astros insuperáveis, cada um com o seu estilo. Aqui no Brasil há também exemplos de deficientes visuais que se tornaram grandes músicos: o compositor e arranjador Sérgio Sá; a cantora Kátia, afilhada musical de Roberto Carlos e protegida do rei no final da década de 70 e início dos anos 80; e ainda alguns componentes da banda Tribo de Jah. Músicos que, além do talento, tiveram a sorte de encontrar o apoio, inicialmente da própria família, com certeza, mas também de pessoas influentes no meio musical.
Aqui na nossa cidade temos também o nosso artista que tomou a música como um meio para superar as barreiras encontradas pelos deficientes visuais. Mas ele não é famoso. Vive quase no anonimato. Dificilmente é convidado para se apresentar em algum evento.
Jorge Soares de Oliveira, 62 anos, mora na Casa de Caridade São Vicente de Paulo (o abrigo), onde chegou no ano de 1965. Bem acomodado num banquinho, à sombra daquela enorme casa, no final da tarde, sem mistérios, ele abre o seu coração. Me contou que com poucos dias de vida, foi deixado na porta de uma viúva, já mãe de 12 filhos. Hoje, tudo que sabe da sua infância foi sua mãe adotiva, a senhora Maria Soares de Oliveira quem lhe contou. Inclusive que o seu problema de visão foi causado em conseqüência de ter sido deixado na porta dessa mulher caridosa, desprotegido das ações do clima daquela região. Mais tarde, com a morte de sua mãe adotiva - a verdadeira ele nunca conheceu -, teve que deixar sua pequena cidade, Lagoa do Sítio, vindo para Ceará-Mirim, e se instalou no abrigo, onde mora até hoje. Nessa época, segundo ele, as coisas eram bem mais difíceis, pois na sua nova morada não existia sequer um radinho de pilha para alegrar o ambiente. Foi aí que ele resolveu aprender a tocar um instrumento. Primeiro o cavaquinho, depois o violão. Autodidata, Jorge não conhece o nome dos acordes que constrói no violão. E o mais curioso: ele é canhoto, mesmo assim não toca com as cordas invertidas e faz as posições por cima do braço do violão e não da maneira tradicional. Como ele mesmo diz, um destro pode muito bem pegar o seu violão e tocar sem problema nenhum, pois a posição das cordas não se altera.
Foi ouvinte assíduo da extinta Rádio Novos Tempos, onde aprendia novas canções ligado nos programas de Etevaldo Alves e do Coronel Ananias. Hoje, nós que fazemos o programa Jovem Guarda Especial, na 87 FM, temos a honra de ter Jorge como ouvinte que aliás, vez em quando faz solicitação de algumas músicas. Sua companheira há mais de 25 anos, a senhora Salete Fernandes – irmã do saudoso “Pedrinho” da Igreja -, divide com nosso amigo todos os momentos da vida. As dificuldades e as alegrias.
Tempos atrás, Jorge fazia parte dos músicos que tocavam na Matriz de Nossa Senhora da Conceição. Eu mesmo o vi tocando muitas vezes, e com diversos parceiros como Marcos Câmara, Ademaci, Oneida e Clóvis (aquele do cavaquinho e da flauta doce). Sobre o motivo do seu afastamento dali, ele, na sua costumeira inocência, afirma que foi devido o aparecimento de um órgão eletrônico que substituiu os outros instrumentos. A verdade meu caro Jorge, é que a questão não está no instrumento em si. O problema é a ribalta em que se transformaram alguns altares. Experiência como a sua eu também já passei. Aliás, nós somos de um tempo em que pra se chegar mais perto de Deus não carecia tanto alarde, tampouco era preciso alçar vôo em balões de gás hélio. Mas tenho certeza que o som dos seus acordes construídos em seu velho violão, na simplicidade nua dos seus momentos de descontração e louvação a Deus, se juntará a outros sons divinos, de instrumentos que certamente não se afinam ao diapasão, e será essa a maneira mais singela, pura e correta de louvar o Pai da criação.
No repertório de Jorge, há uma canção que ele não dispensa: Felicidade, de Lupicínio Rodrigues. “Felicidade foi-se embora e a saudade no meu peito inda mora e é por isso que eu gosto lá de fora, porque sei que a falsidade não vigora.” A impressão que se tem é a de que Jorge vê bem mais além...
Texto: Eliel Silva
Imagens: Arquivo do blog 
* Publicado originalmente no jornal Gazeta Culcural (Ruy Lima), depois no blog Chaminé (Edvaldo Morais)